20/01/2010

Brincando de lojinha


Nas idas e vindas pela comunidade Frei Damião, encontrei algumas placas e dizeres um tanto diferentes, interessantes e, principalmente, divertidos.

E como todo brasileiro - que não desiste nunca - tudo é válido quando se trata de trabalho para conseguir seu sustento.

Encontra-se de tudo!

Na mercearia tem "langeri":

Também tem "Rót Dóg" na porta de casa:




Tem até "pé-dicure"!


Mas, caso não queiram o "Rót Dóg" acima, tem o "X BURGUE DUPLO", "X HEGUE", "MIS KUENTE" ou então, caso prefiram, "CACHORRO KUENTE". Tem para todos os gostos!




Mas, brincadeiras à parte, ontem flagrei umas crianças na frente de uma casa. Fizeram umas mesinhas com blocos de concreto, penduraram umas roupas na cerca e colocaram alguns objetos em exposição.

Hoje passei e estavam lá novamente, com os mesmos objetos: sapatos velhos, um aparelho de telefone, canetas usadas e roupas na cerca. Parei e perguntei o que eles estavam fazendo:

- "Estamos brincando de lojinha, mas se o tio quiser comprar de verdade, pode ser, porque daí a gente pode comprar nosso material escolar".

Fiquei bem agoniado com isso, pensando o tempo todo em como fazer alguma coisa.

Sei que tem gente que deve estar pensando que eu não posso sempre abraçar o mundo. Tá certo, eu não posso. Mas, mais de um pode dar início à este abraço, com certeza!


Por conta disso, tive uma idéia - pequena - mas válida. Vou tentar relacionar as famílias mais necessitadas que possuem crianças na escola. Pedirei ajuda para fazer esta relação às igrejas do bairro e ir aleatoriamente em algumas ruas sem esquecer as crianças da "lojinha".

Assim sendo, quem quiser me ajudar a comprar material escolar, pode me mandar um e-mail pois assim que eu tiver todas as informações necessárias, eu informo.

16/01/2010

Rap do Brejarú

A volta do recesso do Judiciário, na quinta-feira, dia 07/01/2010, começou com muita chuva, congestionamentos no trânsito e muito trabalho. A maioria dos mandados que recebi é do bairro Brejarú, onde fica a comunidade (favela) Frei Damião.

Como já dito e visto nas publicações anteriores, é um lugar péssimo. E para piorar, o difícil acesso independe do clima. Quando chove, sem chance. Quando pára a chuva, pior ainda. Se tem sol e o clima está seco, o cheiro de esgoto é insuportável. E hoje estava assim, nunca me senti tão mal.

Meu principal objetivo era encontrar mãe e filha, para uma audiência importante na próxima semana, que moravam na Rua da Vala, a famosa rua com o maior esgoto à céu aberto que existe em toda a comunidade.

Tive que deixar meu carro no começo da rua e seguir à pé. Pergunta aqui, pergunta dali e nessas idas, a criançada vai se acumulando e acompanhando junto. Percebi que é um grande divertimento para elas, sendo que, em sua maioria, ficam ociosas.

Hoje conheci Cauã e Davi, que são primos e moram nesta rua. Os dois aparentando, respectivamente, seis e sete anos. Moram em casas tipo palafitas, em frente à famosa vala fedida de águas escuras, cheias de lixo e entulho. Cauã está na terceira série e o Davi, apesar de um ano mais velho, está na segunda.

Perguntaram como funcionava meu trabalho e eu disse que era procurar as pessoas a pedido do Juiz e entregar uma cartinha. Cauã me perguntou:

- “O juiz é quem manda, não é?”

- “É sim, ele que manda eu entregar as cartinhas para as pessoas.”

- “Não, tio. Quero saber se é ele quem manda em todo mundo.”

- “Como assim? Mandar em quem?”

- “Se ele manda em todo mundo, poderia falar pra ele mandar o prefeito arrumar a nossa rua. É tão ruim aqui, já peguei um bichinho na barriga e meu pai teve que me tirar duas vezes de dentro da vala.”

Seguidamente, o Davi completou:

- “Ontem minha mãe matou um rato na minha cama, mas eu não fiquei com medo, porque eu tava dormindo” – como se fosse a coisa mais normal do mundo.

Eu não sabia se ria, se chorava, se saía correndo ou se levava os dois pra minha casa. Fiquei muito mal em imaginar como pessoas podem viver assim, num lugar tão ruim e tão perto de mim.

Cauã viu minha máquina fotográfica no bolso e perguntou:

- “Vamos bater foto das casas pobrinhas? Aí pode mandar pro juiz e ele manda o prefeito arrumar porque o Papai Noel nem conseguiu vir na nossa casa neste ano...

- “Certo! Vamos sim!” e lá fomos nós três pela rua da vala com a máquina fotográfica em punho...

No caminho, encontramos o pai do Cauã, que conversou bastante sobre o filho, que tem muito medo que ele se envolva com drogas, que trabalha no Ceasa ganhando R$ 3,00 por dia e sua esposa também.

Achou interessante a idéia de bater fotos, principalmente daquela rua, porque tem esperança que “caia nas mãos” de alguém que tente ajudar. Segundo ele, se a prefeitura conseguisse pelo menos o material, o pessoal, em clima de mutirão, arrumava tudo. Mas nem isso...

Com a idéia das fotos, me passou um CD que rola pela região com o Rap do Brejarú, feito pelos próprios moradores. Juntando minhas fotos de hoje e a música, fiz o vídeo abaixo.

Sinceramente, espero que sirva de reflexão sobre nossas vidas, sobre o que temos de bom, o que podemos dar de positivo para outras pessoas que precisam, o que podemos fazer de útil para ajudar alguém.

E quem não conseguir, coloque-se - nem que seja um minuto - no lugar de quem mora num lugar como das imagens abaixo: